Um texto de aniversário #6

 


Hey, sonhadores! ❤️

Ontem (29), foi meu aniversário e, para não perder o costume, compartilho o texto poético do meu best, Diego Coelho. Boa leitura!

 

 

Verborragia — A Tempestade

Ao longo da nossa história nos habituamos a temer a natureza.

Nos acostumamos a olhar para os céus e ter medo do que ele atira em nós. A tocar o solo e aguardar com uma ansiedade compulsória que ele vibre e trema diante de nossos pés, a mirar o horizonte, rezando para que ele não se contorça em água a nos projete dessa existência. Porém, esses eventos têm em comum duas coisas: a raridade e a inevitabilidade com que acontecem, como se fossem pontos convergentes, estabelecidos como pétreos nos nós do destino. Perpétuos. Imutáveis. Permanentes.

Acontecem. Tal qual eles são.

Únicos e singulares, cada um deles é um evento ímpar, que molda a natureza e a vida de todos ao seu redor. Impõe sua força de maneira imperativa e dobra o tecido da própria realidade a sua vontade, no entanto, ainda assim, mesmo em meio ao caos de sua passagem e formação, existe uma ordem para sua existência. Não importa o que aconteça, um tornado ou um furacão é concreto, tem uma forma definida, depreensível, um funil girando ao redor do próprio eixo. Um terremoto? A colisão de duas massas que se sobrepõem, ou que pela força da física, se repelem ao se chocar, elevando o solo e causando uma série de tremores. Mas e quanto a uma tempestade? Já essa, é única, sim, mas por sua natureza, não por sua forma, uma vez que sua própria essência é o caos, sua forma também o é. Uma força incontrolável que congrega parte de tudo aquilo que nós temos medo, um conclave de forças, onde água, eletricidade e vento se reúnem em uma identidade disforme, capaz de personificar aquilo que a evolução nos ensinou a temer a respeitar.

Mas, na real, o que nós aprendemos a recear não é o que vemos, mas o que desconhecemos. Não sabemos de onde vem essa força, não sabemos para onde ela vai, tão pouco sabemos como detê-la, é certo que a ciência tem suas explicações, seus meios de detecção e prevenção, mas, no fundo, nós sabemos a verdade. Nada disso importa, quando estamos sós, de pé, diante de uma tempestade.

É diante do desconhecido que nos encontramos quando olhamos no olho da tempestade, é ele quem nos olha de volta, revelando a imensidão de tudo o que somos, de tudo que seremos, daquilo que desconhecemos, em nós e nos outros. É nesse momento que percebemos que somos um mero sopro na existência, um grão de areia no oceano, um momento de ordem em meio ao caos e de caos em meio a harmonia dissonante da criação. Uma nuvem solitária a navegar pela vastidão das estrelas, carregando dentro de nós uma centelha da própria existência.

De todas essas forças da natureza, somente uma é capaz de inspirar, em igual medida, ao terror que impõe, a nossos corações. A tempestade instigou Shakespeare, encantou Renato Russo e colidiu com Arcadia Bay. Desde o princípio dos tempos, nos voltamos para os céus e contemplamos a Tormenta, a observamos, buscando desvendar os seus mistérios, procurando entender e decifrar o que contam as vozes de seus trovões, quais segredos e histórias há, quando um relâmpago cruza os céus, mais além, quem nos olha de volta quando ele apaga, e só resta a sinfonia silenciosa de sua fúria latente. É nesse silêncio que precede a cacofonia que nos encontramos, é nesse limbo entre o existir e não existir que a tempestade nos encontra, nos fazendo perceber que ruge dentro de cada um de nós uma tempestade única. Silente. Revolta. Transmuta. Carregando dentro de si, a fagulha de todo o cosmos.

Diante desse fato incontestável, nos resta abraçar o fado, nosso estigma, e aceitar que nossa natureza é o caos. É o fremir de uma Tormenta incontrolável, que como sua homônima, colide, transgride, incomoda, transforma, desconstrói, abstrai. É. Em todo o sentido e extensão que só um existir pode conter. Um finito-infinito, um instante-eterno, uma alvorada poente, onde tudo o que existe cabe, e por caber, transborda por não conter espaço que suporte aquilo que ainda não é, mas já foi e ainda será. Uma constante variável que emula o romper dos céus, a clarear por um instante tão rápido quanto a luz tudo que alcança, conjurando o temor nos corações daqueles que testemunham sua fúria, e então, como se nunca tivesse existido, silêncio, aquele que prenuncia a tempestade, aquele onde nós sabemos residir todas as vozes, entoando uma sinfonia única, harmonicamente disforme, capaz de nos trazer de volta do olho do furacão, de nos trazer de volta de nós mesmos.

Estamos de pé, dentro da nossa tempestade. É o desconhecido que nos olha de volta. Mas não um ignoto qualquer, é o que não sabemos sobre quem nós somos que reside dentro do coração do temporal. Aprendemos a temer a tempestade por seus estragos, e a temer a nós mesmos, por não saber quem somos. Silenciamos as vozes de nossas Tormentas por recear que elas tenham razão, elas têm. Somos mais. Infinitamente mais. Cosmicamente mais. Mesmo quando nos esquecemos de ser.

Existe uma tempestade dentro de cada ser. A nossa tempestade. Como aquelas que rugem nos céus, conjuram medo e fascínio naqueles que possuem a audácia de encará-las. Como suas gêmeas, encontram seu caminho mundo afora, mais cedo ou mais tarde, devastando tudo aquilo que se interpõe diante de si, afinal, nem mesmo nós sabemos do que somos capazes até sermos testados e por isso, nossa tempestade aguarda, silente dentro do âmago de nossa existência.

Somos tempestades. Uma força da natureza feita para moldar o mundo à nossa volta, feitos para se expandir, reinventar, varrer e aterrorizar a tudo aquilo que não sabe de onde viemos, tão pouco para onde vamos. Vagamos pelo mundo em uma trajetória disforme, errática, imprevisível. Somos a soma de todas as nossas forças e nossas vulnerabilidades, atiradas contra aquilo que nos fez a sua vontade, ao mesmo tempo em que somos a beleza daquilo que não consegue nos ter, nos controlar, nos conter. Somos.

Você é tempestade. É uma força mutável e inconstante que atrai a atenção de todos ao seu redor, congregados em uma amálgama de temor e fascínio. Sua passagem desperta, instiga, inspira, marca a tudo e a todos com os quais cruza, fazendo com que se voltem a ti, ansiosos para compreender um pouco mais sobre o fenômeno que és, enquanto tentam mensurar o tamanho da força que reside em um ser tão único, capaz de despertar o medo e o êxtase em igual medida. Um sopro, uma centelha, uma fagulha, ainda que finita, do infinito, parte do cosmos e um universo inteiro, dentro de um único ser. Parte calmaria, mas muita Tormenta.

O que dizem as vozes dos seus ventos? Que males as águas de suas chuvas vieram lavar? Para onde irão suas nuvens nessa nova rotação? Quem você é, de pé, dentro do olho do seu furacão? Tudo isso e muito mais reside em você. É parte de você. Faz com que os outros te admirem. Você tem seus dias de chuva breve e de Tormenta violenta, e são essas flutuações que te tornam singular, única, como sua homônima. Não tema os seus silêncios, aprenda a decifrar sua sinfonia, a regê-la, a dominá-la, dessa forma, quando sua tempestade rugir, saberá orquestrar seus estragos, a compreender a extensão de sua força e que, não existem dimensões para aquilo que é infinito.

Busque não se enquadrar em nenhuma medida, em nenhum rótulo, em nenhum dogma. É muita Tormenta para pouca bonança. Por isso, Abrace a sua tempestade. Que ela te ensine, te ilumine, te converta. Que você emerja dela mais forte, mais abstrata. Afinal, este novo ciclo vem para provar mais cedo ou mais tarde a temporada das chuvas sempre vem, e que as tempestades de primavera, são sempre prenúncio de coisas gloriosas.

Nessa sua nova primavera, busque-se, encontre-se, admire-se e retorne do olho do seu furacão, ainda mais você, e isso, já é mais do que o suficiente, pois você, por você, já é a maestria do que a natureza se dispôs a fazer.

Feliz Aniversário, Fabiane.

 

Tempestades não se forjam: nascem espontâneas do céu, do ar, das vagas, da luta entre as realidades supremas da natureza, entre os elementos agitados, quando se eletriza a atmosfera, quando o oceano não cabe nas praias, quando os horizontes se carregam de negrumes e os ventos varrem desatinados o globo. Não as desencadeia o sopro de um homem, por mais que se ele suponha os pulmões e as bochechas de Éolo.”

Rui Barbosa

 

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