Um texto de aniversário #5

 



Hey, sonhadores! 

 

Dois meses atrás, como sabem, foi meu aniversário. Meu best (Diego) ficou de me enviar o texto referente a essa celebração. Como prometido no último post, segue a prosa poética daquele que me presenteia com palavras cirúrgicas. 

 

Verborragia — Estações

Primavera outra vez, e, por artifício nada sutil do destino, a rosa mais especial que existe em nosso jardim completa mais uma primavera de vida. É estranho pensar o quanto uma medida tão abstrata quanto um número incompleto, 365, pode ter impacto em nossas vidas. Em um ano marcado pelas ausências, cabe mencionar no dia de hoje que não se pode deixar de perceber que a vida é feita de ciclos, que, assim como as estações, possuem tempo, vontade e até mesmo vida própria. Logo, neste dia tão especial, quero lembrar a você de viver as fases da sua vida, suas estações, quero rememorar o fato de que sua existência inicia na primavera e, como somente as flores podem fazer: renascem nela. É hora de renascer, um novo ciclo a aguarda, hora de florescer uma vez mais para vida e para a eternidade. No entanto, um pouco antes, permitamo-nos um passeio pelas estações e seus meandros.

Primavera. No alvorecer das estações, você renova suas forças e recalcula sua rota. A vida não saiu como planejamos, raramente ela sai, é caprichosa demais para se dobrar as nossas vontades, contudo, é sempre importante reconhecer que nada termina de verdade. Toda a existência é composta de etapas, ciclos, assim como as estações nascem na primavera, você renasce em si mesma para uma nova existência a cada novo ciclo. Os erros passados não importam, nunca importaram, eles não definem você, pelo contrário, te ensinam e assim como a vida encontra um meio, você retorna mais forte e mais experiente. Contudo, deixemos a primavera momentaneamente de lado, voltaremos a ela em momento oportuno.

Verão. A estação das emoções e das conquistas reside logo após o seu florescer, para servir de lembrança ao fato de que a maior parte de nossa vida passa diante de nossos olhos em um mero piscar, como uma série de imagens, exibidas através da janela de um carro. Contudo, em raras ocasiões algo acontece, algo muda, uma imagem de tom diferente, forma diferente, existência diferente, passa por nós, o tempo congela, o mundo para. Ali, naquele instante, sabemos que o dito momento é mais do que uma mera imagem, sabemos que ele e todas as partes dele irão durar para sempre no corredor do tempo de nossa existência. Logo, celebrar suas conquistas, os seus verões, faz de você, ser quem você é, se descobrir uma nova ou (velha) pessoa a cada novo entardecer, é ser, por ser e apenas isso já ser o momento derradeiro de clareza em sua existência. O tempo é testemunha de todos os seus verões, de todas as lágrimas de tristeza, mas também as de alegria, não se permitir contemplar tudo o que já conquistou, seria uma severa injustiça para com o momento único que é você. Neste novo ciclo, enalteça com muita ênfase cada vitória, cada novo passo em sua evolução, permita-se, assim como o sol não pede perdão por brilhar, não tenha receios de viver.

Outono. Embora essa seja de fato a estação da melancolia, há de se reconhecer que é também uma estação de transição e, para muitos, a mais bela das estações. Recorro aqui a um de nossos autores mais caros, que em certo momento proferiu “repara que o outono é mais estação da alma do que da natureza.” Drummond, como sempre, tem razão. O outono vive mais dentro de nós do que fora, as flores que esmorecem e caem sobre solo, também são as que mais belas ficam nos tons do verão, o amarelo e vermelho, o lento passar das horas enquanto a temperatura muda vagarosamente são meras metáforas da natureza para que entendamos o momento certo de mudar, de partir. Não se restrinja, não permaneça onde não lhe caiba. Somos seres em constante evolução, compreender e aceitar a mudança é parte essencial do ciclo das nossas estações. Deste modo, em seu vindouro outono abrace sua metamorfose pessoal, seja singular, dual ou plural, quando a tristeza vier e “suas folhas caírem”, repare que é nesse momento que fica ainda mais bela, mais forte, é sua existência preparando-se para uma nova etapa, uma que será maior e melhor que a anterior, pois é nos dias nublados e frios que mais valorizamos a presença do sol.

Inverno. Como não poderia deixar de ser, todo ciclo chega cedo ou tarde ao seu desfecho, no seu caso, como no das estações, o prenúncio da renovação dele, logo, não poderia deixar de ser a estação da introspecção o melhor momento para tal. É curioso como o lento passar do tempo no inverno possui uma maneira incomum de nos levar para longe, não dos outros, mas de nós mesmos. É preciso reconhecer o momento ideal de realizar as viagens para dentro de nós, quando os ventos gélidos sopram é o período ideal para nos reencontrarmos, para pensarmos em tudo o que passamos, colher os frutos de nossas decisões e nos armarmos com nossas novas experiências. Quando crianças, valorizamos mais do que tudo o desejo de crescer e ser independentes, sem perceber, gastamos sem medidas com nossa ingenuidade aquilo que temos de maior valor, o tempo, afinal, ele faz de nós quem somos, tudo e todos curvam-se a marcha inexorável de sua presença, mas será que 365 dias, 8766 horas, 525960 momentos, são o bastante para calcular uma vida? Ou a vida é como sempre deveria ser? Sem medidas e sem restrições, independente? A resposta, em linhas curtas: Primavera. No fim, por mais forte que seja o frio, a vida acha o seu caminho, ela sempre vence, o que nos leva em retorno ao reinício de nosso ciclo.

Retorno a primavera recordando que certa vez, o saudoso professor Nonato, falando sobre os autores regionalistas, nos disse que podemos sair do sertão, mas que o sertão não sairia de nós. Neste dia, afirmo, sem medo de errar, que o mesmo pode-se dizer de sua primavera, por mais que tente fugir dela, ela te acompanhará, aonde quer que vá. Você nasceu primavera, é primavera, é beleza e euforia, é tempestade e calmaria, é calor e frente fria, é vida e entropia. Não importa o que aconteça, nenhum outono ou inverno jamais terá poder para te esmorecer, o verão é teu constante aliado e serve para te fortalecer cada vez mais, permitindo que alcance patamares ainda maiores do que jamais esteve, deste modo, nenhuma melancolia ou introspecção jamais serão páreos para quem traz dentro de si a existência.

Neste desabrochar de seus novos ciclos, permita-se seguir as estações, que cada uma agregue a você somente o que lhe for melhor e quando os ventos da mudança soprarem, transite, vague, como uma folha curvada ao vento, renda-se a mudança, mas, não perca nunca de vista que você tem raízes profundas e vastas, elas te sustentam, te guiam, te formam, te transformam. Te fazem. És primavera, aqueça, apareça, floresça.


“Quase novembro, a ventania de primavera levando para longe

os últimos maus espíritos do inverno.” Caio F. Abreu

 

Diego Coelho

 


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